sábado, 16 de novembro de 2013

Obstáculos 1 - Egoísmo e Separação



Saudações a todos.

Agora iremos iniciar uma série de sete textos, contendo explicações mais detalhadas sobre os pensamentos, vontades e ações dissonantes que são muito frequentes em nossa vida, e que nos afastam do Amor Divino, atrasando nosso caminho para a Reintegração. 

Como já dito no post anterior, os conceitos de “mal” e de “Diabo” podem ser úteis para entendermos melhor esses impulsos dissonantes – podemos imaginar que eles são algo como “tentações do Diabo”, o que pode facilitar nosso entendimento e ação frente a essas questões.  Mas com a importante ressalva: esses conceitos de “mal” e “Diabo” não devem ser usados para nos fazer de vítimas de “forças ocultas” externas a nós, pois na realidade essas “forças” têm seu poder outorgado por nós mesmos.

Esses impulsos dissonantes nos acompanham no dia a dia e fatalmente nos levam a atitudes desequilibradas e desarmônicas, que trazem suas consequências: os contratempos da vida.  E esses contratempos, dos mais simples aos mais graves, servem como indicadores de que estamos no rumo errado em algum aspecto mais ou menos importante de nossa vida – eles são a principal fonte das chamadas “lições de vida”, tão importantes e preciosas.  Esse processo de aprendizado pelo erro é o mais frequente em nossa vida, sendo chamado por algumas tradições de “caminho da dor”.  Deve-se ressaltar que esse processo não é o único – existem formas menos “dolorosas” de se progredir no caminho da Reintegração.

Assim, uma atitude verdadeiramente mística e harmonizada com o Amor Divino é ser grato a tudo o que lhe ocorre, em especial aos contratempos – eles contêm as lições que você precisa, naquele exato momento.  A gratidão é realmente um sentimento sublime, e deve ser exercitada o tempo inteiro, em especial nas situações que não nos favorecem.  Essa gratidão tem por fundamento a confiança nas leis do universo, a fé em Deus – Ele sempre provê o melhor para nós, a todo momento.

Para podermos lidar melhor com os contratempos da vida, é importante ter uma ideia mais detalhada das dissonâncias que se desenvolvem em nosso interior, na nossa relação com o mundo, com as outras pessoas, ou conosco mesmos.  Como é bem óbvio, existem diversos tipos de dissonâncias, que dão origem a diversos sentimentos, pensamentos e ações desequilibradas e “negativas”, que trazem consequências autodestrutivas.  Neste e nos próximos posts, iremos nos dedicar a essa tarefa.

Antes de começar, devo lembrar que o conceito religioso de “pecado” é muito próximo ao de “impulso dissonante” que exponho em meu texto.  A restrição que tenho àquele conceito tem origem na forma que as religiões ensinam a lidar com ele, renegando-o e culpando-se por estar “sob a influência do Diabo”, em uma atitude de “combate”, de luta interior, que normalmente não é a mais construtiva.  Por outro lado, penso que devemos sempre lembrar o princípio da Unidade Divina, que diz que tudo está em Deus, e tudo merece ser abençoado, sem condenações, sem culpas. 

Assim devemos encarar nossas dissonâncias como partes integrantes de nós, merecedoras de carinho e atenção, para serem transformadas em algo melhor, para serem “banhadas no Amor Divino”, de forma a se dissiparem as “sombras da ignorância”.  Essa é a “Grande Obra” dos místicos, tão citada na Alquimia. 

Na realidade, essa transformação interior é o principal processo que devemos buscar em nossa vida, e o tempo inteiro o mundo nos estimula a ir em frente, com novos desafios – justamente os contratempos já citados.  Vamos seguir então, nessa caminhada tão linda da Reintegração Divina!

Devo dizer também que essa série de posts vai abordar cada um dos sete pecados capitais da tradição cristã, e mais outras sete dissonâncias básicas, no total de 14 dissonâncias, sendo duas por post.  O tema deste post são as dissonâncias do egoísmo e da separação, tão ligados entre si.

Estou começando pelo egoísmo porque, para mim, ele é “O Pecado Capital”, ou seja, ele representa a dissonância de onde provêm todas as outras dissonâncias. E o egoísmo se origina na ilusão mais básica do eu sensível: a separação de Deus.

Pelo princípio da Unidade, somos todos unos com Deus, e unos entre si, unos com o universo à nossa volta.  A nossa consciência objetiva não percebe tal união, e isso tem uma razão de ser: precisamos da ilusão da separação, da individualidade, para podermos agir de forma efetiva em nosso universo sensível.  Na realidade, a individualidade é uma ferramenta básica para uma vida saudável.  Quem não consegue desenvolver de forma adequada sua personalidade individual, certamente terá problemas psicológicos sérios.

Esse tema da unidade x individualidade já foi explorado em outro post, por ora basta dizer que, em nosso processo de amadurecimento e desenvolvimento de nossa personalidade, a consciência individual é de fundamental importância, e ela será o ponto de partida para a caminhada mística, em busca da Reintegração Divina.  Só que a sociedade e a cultura atual supervalorizam a noção de individualidade, de independência em relação ao resto do mundo, estimulando um individualismo cada vez mais exacerbado, que traz como consequência um crescente sentimento de “vazio interior”.

Esse “vazio” ocorre porque a consciência individual não existe para ser um fim em si mesmo, ela tem por função ser uma orientação, uma referência no caminho da Reintegração, que inclui a harmonização com o Amor Divino.  E quando ignoramos esse ponto fundamental nos sentimos sem um norte, sem rumo, sem saber o que fazemos nesse mundo.  Mas quando encontramos o caminho da Reintegração, quando sentimos o Amor Divino em nosso coração, qualquer angústia se dissipa, e sentimos uma paz realmente profunda.

Vou fazer uma ressalva aqui, deixando claro que não estou defendendo o caminho místico como o único que traz felicidade.  Se a pessoa se sente feliz em uma outra via qualquer, por exemplo, se realizando em sua profissão, sendo um esportista, um artista, um realizador nesse mundo, sem precisar pensar ou ter alguma relação com Deus, que seja muito feliz!  Mas acredito que, mesmo nesse caso, essa pessoa encontrou uma forma de se harmonizar com o Amor Divino, somente não tendo consciência disso – mas isso não é relevante, já que, para a visão mística, o mais importante é mesmo ser feliz.

Devo dizer que a principal característica do Amor Divino é ser totalmente inclusivo, solidário, gregário, é nos fazer enxergar o outro, prestar atenção nele, reconhecer suas semelhanças e diferenças conosco e... amá-lo do jeito que ele é,de qualquer jeito.  Esse é o amor incondicional, tão difícil de se colocar em prática, e tão necessário ao ser humano.
 
 


Pode-se dizer que o egoísmo, então, é a negação dessa Unidade, é a ilusão primordial de nossa consciência, a de achar que somos separados, que somos independentes e, que, com isso, existe real conflito, disputa, competição entre as pessoas.  O egoísta é aquele que desenvolve sua consciência individual e se encanta com essa consciência, a ponto de considera-la o máximo, o valor supremo, negando a presença íntima e indissociável de Deus em nós, dando as costas para o Amor Divino.

Sendo assim, todas as vezes que tenho uma atitude egoísta, que penso primeiro em mim, que entendo que o outro é meu “inimigo”, que vai me prejudicar e que tenho que me prevenir e prejudicá-lo antes, todas as vezes que nego ajuda a quem efetivamente precisa, que maltrato alguém, que minto para levar vantagem sobre alguém, que exploro a boa vontade de alguém, que contribuo para preconceitos e discriminações contra alguém, que me envolvo em intrigas e fofocas contra alguém, que me sinto vítima de alguém, que manipulo os sentimentos de alguém, que me aproveito de alguma posição de vantagem para meu próprio proveito, que não faço o que seria esperado de mim em favor da coletividade, e muitas outras situações desse tipo, em todos esses momentos, estou com um pensamento egoísta, do tipo: “eu sou assim e o outro é diferente, é ameaçador, é estranho, não merece ser amado”.  E esse pensamento contém a ilusão máxima da separação.

Porque, em um nível essencial, todos somos um, todos estamos conectados de forma indelével à Deus, todos estamos aqui nesse mundo com o mesmo objetivo fundamental: se harmonizar com Deus.  Posso afirmar então que todas essas atitudes acima descritas tem como grande vítima eu mesmo, que certamente sofrerei consequências naturais dessas atitudes destrutivas – “quem semeia ventos, colhe tempestades”.

Então, como agir? Como ter uma atitude altruísta sem ser ingênuo, sem andar por aí rindo à toa e aceitando tudo, sendo o “bonzinho” que nunca progride ou conquista nada de relevante, por não se opor a nada e a ninguém.  Essa questão é bem complexa, sendo uma questão fundamental no que chamo de “arte de viver”, mas uma boa imagem que nos ajuda a entender melhor a correta atitude é a educação de um filho.

Como agir ao educar seu filho?  Deve-se aceitar tudo o que ele faz, confiando que “somos todos um”, que ele tem a mesma consciência que nós, que a vida vai ensinar, que temos que “amar incondicionalmente”?  Claro que não, os especialistas em educação já escreveram muitos livros mostrando a importância de dizer não, de dar limites, de mostrar o certo e o errado, de adverti-los, castigá-los se necessário.  E deixamos de amar nossos filhos por causa disso?  E eles deixam de nos amar por receberem palavras duras, castigos na hora apropriada?  Pelo contrário, quando se educa com amor, os filhos são eternamente gratos a nós por darmos os limites, que são fundamentais na formação de suas personalidades.

E assim devemos agir com todas as pessoas no mundo, amando-as incondicionalmente sim, como filhos, como irmãos, mas dando os limites, mostrando a elas quando se está feliz ou triste, satisfeito ou não, mostrando que eles são muito importantes para nós, mas que eu também sou muito importante, e não devo me anular ou aceitar tudo sem restrições.  Afinal, como posso amar alguém se não amo a mim mesmo?

E esse ponto é muito importante: devemos amar e aceitar todos como são, a começar por nós mesmos.  Todos temos nossas necessidades básicas, que não são só de comida e abrigo, não são somente materiais, não estamos nesse mundo somente para sobreviver.  Todos temos direito à realização, no sentido mais amplo dessa palavra: realização pessoal, afetiva, profissional, todos temos direito a uma vida digna, com oportunidades para desenvolvermos nossos talentos naturais, de forma a contribuirmos mais efetivamente para a Reintegração, para o destino da humanidade.

Assim, a atitude altruísta que proponho aqui não é simplesmente uma resposta a uma manipulação externa qualquer (tão freqüente), simplesmente um meio de “limpar a consciência” por eu ter muito e outros terem tão pouco.  Até porque “felicidade” e “realização” não se medem em números – pode haver pobres com um nível de felicidade muito maior que ricos.  Não é uma questão puramente material, de distribuir riqueza, mas muito mais uma questão espiritual, de compartilhar sabedoria, de despertar consciências.  Afinal, o que é mais importante, dar o peixe ou ensinar a pescar?

Em outras palavras, não se trata simplesmente de dar esmolas aos outros, a esmola é uma das formas menos eficientes de altruísmo.  Trata-se sim de amar verdadeiramente os outros, um amor maduro, de alguém que tem plena consciência do seu valor, que não busca somente preencher uma carência  - que é comum a todos nós, mas que não pode ser a única motivação -, alguém que tem plena consciência que somos todos unos em essência, e temos todos esse valor maravilhoso dentro de nós, somos todos manifestações sensíveis da divindade, e merecemos o máximo respeito por isso.

Ser altruísta então é respeitar os outros e a si mesmo, é ter relações ricas e profundas, diálogos construtivos, é compartilhar idéias e conhecimentos, é provocar reflexões, é se interessar pelas questões alheias, dar o devido apoio, sem manipulações, é ser um ombro amigo, é ser amigo em todas as horas, e isso vale para todas as ocasiões, em relação a todos os seres do universo, afinal todos somos um, não é mesmo?

Concluindo, ser altruísta é saber que, como somos todos um, em última análise ninguém poderá te prejudicar e ninguém poderá ser prejudicado por você, a não ser você mesmo.  Analisando de forma mais profunda, pode-se concluir que ajudar os outros não é simplesmente uma questão moral – é um ato de sabedoria.  Não se ajuda os outros para ganhar uma “recompensa” depois, essa “recompensa” ocorre no momento em que se ajuda, só não temos consciência disso 

Devo dizer ainda que o grande inimigo do ser humano é a sua própria ignorância – se todos soubessem como é bom colaborar para um futuro feliz em comum, todos dedicariam suas melhores energias para esse fim.  Eu realmente acredito que estamos evoluindo em nossas consciências, que estamos dissipando as névoas da ignorância, e que cada vez mais a humanidade vai agir de forma altruísta.  Que assim seja!

Saudações fraternas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário