Saudações a todos.
Vou falar hoje de um tema que considero muito importante, e
que está muito ligado a tradições místicas e religiosas: a morte.
Já tive oportunidade de tratar desse tema, no post “O ciclo
da vida”, em que me propus a responder à célebre pergunta: para onde vamos após
a morte? Para tratar desse aspecto, peço
que acesse aquele post.
Agora devo falar de outro aspecto, que vem a ser o lado
“prático” da morte, ou seja, aquelas questões que realmente influenciam nossa
vida atual. Existem dois aspectos
ligados a essa questão, que serão tratados nesse texto:
a)
o significado da consciência da morte e suas
implicações para nossa vida; e
b)
a adequada preparação para a morte.
Ao contrário do que muitos possam pensar, a morte é um
assunto presente em todos os momentos da vida.
Pode parecer estranha essa afirmação, pois um raciocínio mais simplista
pode indicar que a morte só adquire importância quando “sentimos” que estamos
próximos a ela. Ou seja, uma pessoa
jovem e saudável nem deve perder seu tempo pensando nessa questão, que costuma
ser bem desagradável para a maioria das pessoas.
A cultura ocidental tende a considerar a morte uma
verdadeira maldição, algo tenebroso, assustador, que infunde medo e terror
profundos em corações e mentes. Em suma,
algo a ser “evitado”, como se isso fosse possível. A medicina moderna tende a encarar a morte
como a “derrota” dos esforços da ciência para prolongar a vida – derrota
recorrente, diga-se de passagem. A
psicologia inclusive afirma que nosso medos derivam de um medo fundamental – o
medo da morte. Com isso, a morte é
considerada a “mãe” de todos os nossos medos e angústias, o que talvez seja um
pouco “injusto” com ela.
Não custa lembrar inúmeros contos e filmes de terror, que
via de regra exploram à exaustão o medo da morte, para impressionar seus
leitores ou expectadores – particularmente, nunca fui fã do gênero.
Como consequência dessa negação da própria ideia da morte –
de forma geral, ninguém pode nem falar sobre esse assunto – criou-se uma
situação muito estranha: sabemos que vamos morrer, mas, em geral, vivemos como
se não soubéssemos, como se fôssemos viver eternamente, o que muitas vezes traz
consequências terríveis. Posso chamar
isso de “imaturidade vital”.
Quantas famílias se veem desamparadas pela morte súbita de
uma pessoa, da qual elas dependem?
Quantas empresas vão à falência depois que seu fundador morre? Quantos maridos e esposas ficam totalmente
sem rumo após a morte de seus parceiros?
Todos estavam vivendo como se não fosse possível ocorrer a morte – logo
ela, que é a única certeza que temos nessa vida...
E por que as pessoas em geral têm essa visão tão estranha
sobre a morte? Uma explicação mais geral
diz respeito ao eu sensível. Como já
abordado em outro post, o eu sensível é o conjunto de atributos mentais com os
quais nos identificamos nesta vida – a percepção que temos de nosso corpo,
nosso temperamento, nossas emoções, nossas opiniões, nossas atitudes, etc.
O eu sensível consiste em uma construção mental,
desenvolvida ao longo de nossa vida, desde a mais tenra infância, quando nos
identificamos por contraste, ou seja, por comparação com as pessoas à nossa
volta. Já houve situações de pessoas
criadas em ambientes selvagens, sem a presença de seres humanos, e que se
comportam como animais selvagens, sem desenvolver linguagem ou atitudes
humanas. E isso demonstra o fato de que
a formação de nosso eu sensível é um fenômeno social.
De acordo com a visão mística, esse eu sensível, que é
fundamental para nossa vida, deve ser devidamente harmonizado com Deus, ou
seja, deve-se submeter à Lei do Amor, e estar em consonância com as energias
mais sutis que ele puder sintonizar.
Isso é necessário para que a pessoa tenha o devido equilíbrio físico,
mental e social, mantendo-se em perfeita saúde e em estado de felicidade.
Caso contrário, esse eu sensível desarmonizado pode querer
assumir o papel central na vida da pessoa, que passa a se preocupar somente com
seus próprios interesses – é o egoísmo.
E uma das principais características da visão egoísta é justamente o
medo da morte, já que a morte é simplesmente o fim do eu sensível. Se nos identificamos plenamente com nosso eu
sensível, sem a consciência de que há energias mais sutis em nós, a morte pode
ser considerada o fim de nossa existência, o nosso aniquilamento total – e a
consequência natural dessa concepção é o medo da morte.
Assim, independentemente da cultura em que a pessoa se
insira, se ela tem uma visão egoísta do mundo, não reconhecendo planos
transcendentais ou energias mais sutis, o medo da morte é plenamente
justificável.
Mas existe outro motivo para termos medo da morte, e esse é
ligado à cultura ocidental, em especial ao cristianismo, que vem a ser a
doutrina cristã do final dos tempos – camada de “escatologia cristã”.
Por essa doutrina, devemos, em vida, sermos exemplos de
santidade para o mundo, praticando as virtudes e evitando os pecados. Estes, de forma geral, devem ser devidamente
perdoados por um sacerdote, antes que você morra, pois, caso ocorra sua morte
com algum pecado “pendente” de perdão, você pode simplesmente ser condenado ao
inferno por toda a eternidade.
Outra opção possível, caso seus pecados “pendentes” sejam de
pouca gravidade, seria você passar um tempo expiando seus pecados, num lugar
chamado purgatório, para, depois de anos, poder chegar ao paraíso, reservado a
muito poucos – afinal, quem consegue obedecer a todas as normas de conduta de
uma religião, quem não comete algum pecado de vez em quando?
Assim, mesmo dentre os que acreditam em algo superior ao eu
sensível, e entendem que a morte não é o fim do ser, mesmo nessa hipótese,
aqueles que seguem a doutrina cristã acreditarão que a morte é a transição
para, no mínimo, uma prisão horrorosa (o purgatório) ou então o verdadeiro
inferno eterno. Quantos, em seu íntimo, não se julgam merecedores de arder no
quinto dos infernos para toda a eternidade?
Muitos, tenho certeza.
De qualquer forma, a ideia de morrer não parece muito
agradável aos cristãos, já que ser santo nesse mundo é para muito poucos, e a
maioria das pessoas está bem consciente disso... E a doutrina cristã tem imensa influência
cultural em toda a civilização ocidental, o que torna o medo da morte algo
realmente generalizado em nossa cultura.
Com todo esse contexto cultural desfavorável, a maioria das
pessoas não chega a refletir adequadamente sobre o significado da morte, e
sobre a importância que ela tem em nossa vida, todos os dias. Com isso, elas não se preparam para a morte,
não “aprendem a morrer”, não percebem que podem morrer com dignidade, com
harmonia, com paz interior. E aí, quando
é chegada a hora... Trava-se uma guerra
horrorosa, em que o derrotado já é conhecido desde o princípio, mas que se
prolonga por muito mais tempo que o necessário, em agonias intermináveis, com
consequências muito ruins para todos – o que está morrendo e seus familiares e
amigos.
Quantas pessoas falecidas com quem você conviveu – amigos,
parentes – souberam se “comportar” diante dela?
Quantos abreviaram sua existência, com medo de encarar o final de sua
vida, em atos suicidas mais ou menos prolongados? Quantos prolongaram sua vida muito além do
recomendável, sobrevivendo a muito custo, só para “evitar” o inevitável? Quantos ficaram angustiados, deprimidos, desesperados,
ao tomar consciência do fim de sua vida neste mundo?
E quantos encararam a situação com a serenidade que ela
merece, com equilíbrio e harmonia com Deus, fazendo de tudo para que sua
transição para um plano mais sutil seja a mais construtiva possível? Você sabia que a hora da morte é muito
importante em nossa vida, sendo uma oportunidade rara de fazermos um grande bem
à humanidade e às pessoas à nossa volta?
Vamos ver esses pontos com mais detalhe.
Vamos começar com uma reflexão sobre a morte e sobre a
consciência da morte. Todos os seres
vivos morrem, e a morte de um ser qualquer tem uma função importante na
natureza, de renovação do ciclo de vida – uns morrem e outros nascem, é a lei
natural. Mas o ser humano é o único que
sabe antecipadamente que vai morrer, e que sabe perfeitamente o que isso
significa.
Naturalmente, muitos animais têm consciência de que vão
morrer alguns momentos antes, mas considero isso um simples instinto de
sobrevivência – essa consciência prévia tem por finalidade somente fazer com
que ele tome todas as providências para evitar aquele desfecho. O ser humano é diferente, ele pode estar
perfeitamente saudável, desde que ele tenha a mínima maturidade para tal (a
partir de uns 7 anos de idade mais ou menos), ele já sabe que um dia irá
morrer, assim como todos os seus parentes, amigos e conhecidos – todos irão
morrer, e isso é certo, todo o resto é duvidoso.
E por que temos essa consciência mórbida? Será uma “brincadeira” de Deus, para que
possamos viver com medo, e com isso sermos manipulados por pessoas
inescrupulosas, que têm menos medo que nós?
Prefiro acreditar que essa consciência existe para que tenhamos muito
tempo para refletir sobre a morte, seu significado, sua influência em nossa
vida, e para que possamos morrer bem, em todos os sentidos. Ou seja, ela existe para ser bem utilizada, a
nosso favor.
E como usar a consciência da morte a nosso favor? Um argumento óbvio é o de afastar o medo de
correr riscos, afastando a apatia e a inação e tornando-nos mais corajosos e
dinâmicos, em busca de nosso objetivos de vida.
Esse raciocínio é bem simples e direto: a vida é curta e pode acabar a
qualquer momento, então... Vamos aproveitá-la no que ela tiver de melhor.
Não devemos deixar para amanhã, para uma próxima vez, para o
ano que vem, pode ser que lá estejamos mortos.
Se sentimos no coração e na mente que devemos buscar um sonho, temos que
buscá-lo logo, afinal não se sabe quanto tempo temos de vida. Essa perspectiva de “urgência” da vida pode
ser muito útil quando estivermos hesitando, com medo de correr riscos, abrindo
mão de importantes conquistas – toda conquista relevante envolve riscos
relevantes.
Mas existem outras reflexões bem interessantes. Vamos imaginar que não morrêssemos, que
fôssemos imortais. Como seria nossa
vida? Será que isso seria uma
bênção? Ou seria uma prisão
perpétua? Se fôssemos ricos e poderosos,
tudo bem (até o dia em que perdêssemos esse poder e/ou riqueza, que, como
sabemos, nunca são eternos), mas e se fôssemos criaturas sofredoras, exploradas
e marginalizadas, vítimas de violências e abusos? Não teríamos o simples direito de
morrer? E se sofrêssemos de doenças
muito graves, que nos impusessem limitações radicais, e se vivêssemos presos a
uma cama, malcuidados e vivenciando sofrimentos sem fim? Isso seria bom?
Assim, podemos perceber que, em várias situações a morte tem
sua utilidade... Vamos pensar em outra
situação: uma sociedade que vive sob o domínio de um ditador poderoso, que
inibe a todos com seu carisma e seu poder.
Aquela pessoa que concentra habilidade de manipular os outros e de manter
tudo sob seu controle, sem deixar ninguém mais se sobressair. Essas pessoas existem, e aparecem de vez em
quando na história da humanidade. Muitas
vezes promovem guerras, genocídios, execuções em massa e outras barbaridades,
tudo em nome de seus interesses pessoais.
Já pensou se essas pessoas não morressem?
A situação acima, um tanto extrema, pode ser replicada, em
menor escala, em nosso dia a dia: quantas pessoas simplesmente cristalizam seu
pensamento e suas opiniões, se recusando a aceitar o progresso do mundo? Quantos insistem em suas verdades já
ultrapassadas, não percebendo as virtudes do novo e vivendo, nostálgicos,
lamentando que as coisas “não são como antes”.
Há muitas pessoas que simplesmente paralisam sua evolução pessoal e
ficam ali, brigando contra o mundo e reclamando da vida. Se essas pessoas não morressem, como seria a
vida delas? E como seria o mundo? Será que teríamos avançado tanto, em termos
de ciência e cultura, e em especial em termos de liberdade de comportamento?
Daí percebemos a ligação da morte com a renovação, pois, tal
e qual na lei natural, de vez em quando o velho deve morrer para dar lugar ao
novo. Esse fato aponta para uma
compreensão estendida da morte. A “morte
estendida” representa a renovação de qualquer parte de nós, de qualquer aspecto
de nosso ser.
Nesse sentido, todos os dias morremos em alguns aspectos,
para nascerem novas versões de nós mesmos, em relação a esses aspectos. Não estou falando só em células de nosso
corpo (que morrem e nascem aos milhares, todos os dias), mas em ideias antigas,
costumes abandonados, mudanças de vida em geral. Todas essas ocasiões são como uma “morte”
para nós, e muitas vezes temos medo, por temermos o desconhecido – o novo é
sempre desconhecido, por definição.
Assim, quando nos casamos, o nosso “eu solteiro” morre e
nasce um “eu casado”. Quando temos
filhos, o mesmo ocorre, e também quando nos formamos, mudamos de casa, de
emprego, todas são pequenas mortes, que encaramos de forma mais ou menos
harmoniosa. Todas provocam o chamado
“estresse”, que nada mais é que a adaptação de nossa mente ao nosso novo
eu. E como temos vivido estressados...
Isso é um indicador de quanto temos morrido e nascido nesses tempos modernos...
Uma reflexão interessante: tente se lembrar de como você era
há 10 ou 15 anos atrás (ou mais tempo, se preferir). Procure se lembrar, você é a mesma pessoa
hoje em dia? Certamente que não –
inclusive, quase todas as células de seu corpo já não são mais as mesmas. Isso significa que, nesse tempo, você já
morreu inúmeras vezes e já renasceu, em vários aspectos de seu ser, de forma
que, muitas vezes, a gente se transforma inteiramente, e se torna outra pessoa,
sem mudar de identidade. E essa é
precisamente a dinâmica da vida, é assim que tem que ser.
Com isso, quero dizer que, nesse sentido estendido, a morte
é parte integrante da vida, sendo responsável pela sua renovação e dinamismo
indispensáveis. Sem a morte, a vida
seria estática, o que iria contrariar totalmente sua natureza. A morte é, então, um componente essencial da
vida. Não existiria vida, da forma como
a conhecemos, sem a morte.
Assim, podemos e devemos ser amigos da morte, percebendo-a
como uma aliada. E qual a forma prática
de fazermos isso, em nosso dia a dia?
Treinando uma virtude preciosa, o desapego, e combatendo um obstáculo
muito importante, a avareza.
Pois o desapego é justamente o que nos permite largar
hábitos e ideias arraigados, mas que não nos servem mais e embarcar no
novo. Se formos avaros, ou seja, se
considerarmos esses hábitos e ideias como parte essencial de nosso ser, será
muito difícil realizar a tão necessária renovação, que garante o avanço na
caminhada rumo à Reintegração Divina. Se
ficamos presos ao antigo, não há espaço para evolução.
Temos que ter a consciência de que, para obtermos progressos
significativos na caminhada, muitas vezes temos de abrir mão de coisas
preciosas para nós, que foram extremamente úteis no passado, mas que agora são
um empecilho. E o problema é que muitas
vezes essas coisas são muito agradáveis, estamos tão acostumados, aquilo nos
faz tão bem... Mas às vezes é hora de
mudar, ou seja, temos que morrer um pouco, para nascermos renovados adiante.
Além dessa reflexão sobre a importância da morte em nosso
dia a dia, e de como é relevante termos a morte como amiga e aliada em nossa
caminhada mística, vamos agora tratar do grande momento, da morte em seu
sentido mais comum, que é o momento em que deixaremos a vida neste
planeta. A única dúvida é quando, porque
já sabemos todos que esse momento chegará, mais cedo ou mais tarde.
E aí, o que devemos fazer?
Ignorar que esse momento chegará, e quando chegar, ver o que dá para
fazer? Por incrível que pareça, é essa a
atitude da imensa maioria das pessoas. E
o mais incrível é que as pessoas em geral gostam de planejar as coisas com
antecedência: se têm uma festa, uma viagem, um compromisso profissional
qualquer, é muito comum fazerem planos, se programarem, se prepararem
adequadamente, para que, na hora certa, tudo transcorra da melhor forma
possível. E quanto à morte, que é o
único evento certo dessa vida, teoricamente o único para o qual nós deveríamos
estar bem prevenidos? Por que não
planejamos, não nos preparamos para esse momento?
A resposta é óbvia: porque somos totalmente bloqueados por
esse medo atávico, que nos impede de ter o mínimo lampejo de racionalidade ao
cuidar desse assunto. Mas afinal, o que
significa exatamente se preparar para a morte?
Como se preparar para algo que eu nem sei direito do que se trata? Não vou tratar aqui de questões materiais, de
detalhes do enterro, de herança, dessas coisas (que são cuidadas por muitos),
estou falando da morte mesmo, do momento pessoal e único em que deixamos esse
mundo físico, e de como deveremos nos comportar nessa hora.
Mas antes devo falar um pouco sobre um assunto que, para a
visão mística, é muito importante: a iniciação.
Esse é um assunto que será melhor explicado em outro post, mas vou
descrever o que é uma iniciação em poucas palavras: é um evento de mudança de
estado sutil em uma determinada pessoa – o iniciando. Essa mudança é sempre individual e subjetiva,
ou seja, ocorre dentro de cada ser, individualmente.
Explicando melhor, a iniciação é um momento muito especial
na vida de um místico, em que ele é submetido a energias sutis poderosas, que
irão alterar seu nível de consciência, dando um passo relevante a caminho da
reintegração. Durante a iniciação e
pessoa fica exposta a “radiações” de energia muito sutil, despertadas por
mecanismos diversos – normalmente por um grupo de pessoas em um contexto
ritualístico – e, influenciada por essas energias, ela aumenta de forma
significativa sua “frequência” de energia própria, elevando seu estado de
consciência. É como uma interferência
energética do bem.
Deve-se ressaltar que estamos continuamente submetidos a
energias diversas, a maioria delas de caráter dissonante, e somos influenciados
o tempo inteiro – muitas vezes, essas energias baixam nossa frequência até o
ponto em que nosso organismo se desequilibra, e ficamos cansados, mau
humorados, desorientados, ou mesmo doentes.
Só que essas influências, em geral, são passageiras, pois logo você tem
contato com outras energias que anulam a influência da anterior – é como uma
sucessão de ondas do mar batendo na costa, uma anulando a outra.
E assim pode ocorrer também com a iniciação, mas, nesse
caso, há uma questão diferente: as energias com as quais o iniciando entra em
contato estão harmonizadas com Deus, e, pela Lei do Amor, são mais poderosas
que qualquer outra. Assim, se o
iniciando estiver disposto a se harmonizar plenamente com essas energias
sublimes, seu ser sofrerá transformação, muitas vezes irreversível, por um
motivo simples: o iniciado não vai querer voltar ao estado anterior. Uma comparação meio boba é você começar a
andar em um carro com ar condicionado em uma cidade quente – você nunca mais
vai querer voltar a andar em um carro “sem ar”, é “irreversível”.
E a iniciação é um tipo de morte, pois, quando o iniciando
entra em contato com essas energias sutis, seu ser se transforma, e as energias
antigas com as quais ele interagia já não servirão mais para ele – é como se
ele tivesse morrido para elas, e nascido para o contato com energias mais
elevadas. Em alguns casos, a pessoa pode
até romper relacionamentos que não mais são relevantes para ele, ou mudar de
profissão ou moradia – mas nada disso é realmente necessário, o mais importante
é a transformação interior.
Sendo assim, o místico que já passou por iniciações já
morreu algumas vezes nessa vida, e já renasceu – existem algumas iniciações em
que a pessoa literalmente muda de nome, adotando um nome místico para ocasiões
especiais, simbolizando esse “nascimento” para uma vida diferente. Algumas tradições falam também do nascimentos
de um “novo homem” no interior do místico, à medida que ele avança em direção à
Reintegração Divina.
E, nesse conceito, a morte é considerada, na visão mística,
como a “Grande Iniciação”, ou seja, o momento em que seremos submetidos às
energias mais sutis acessíveis a nós, mais próximas de Deus, e, caso estejamos
harmonizados com essas energias, poderemos ter mudanças consideráveis em nosso
ser, ampliando nossa consciência de forma sensível, para uma “futura vida” mais
harmoniosa – ver post do “Ciclo da Vida” para maiores detalhes sobre essa
“futura vida”.
Assim, o momento da morte, para a visão mística, é uma
oportunidade de harmonização divina inigualável. Essa harmonização pode ser tão profunda que
pode inclusive ajudar a todas as pessoas que estiverem à volta do místico –
pessoas que conviveram com ele, que o conheceram, que gostaram dele. A morte pode ser uma ocasião de auxílio para
si e para outras pessoas.
Sendo assim, um místico pode e deve se preparar bem para
esse momento, considerado um momento glorioso o momento em que ele vai se
“encontrar com Deus”, e sentir suas energias maravilhosas. Detalhe: todos, sem exceção, vão sentir essas
energias sutis, mas cada um vai percebê-las conforme suas crenças e emoções
predominantes naquele momento.
Assim, alguém que tenha vivido considerando que a vida é uma
guerra em que o mais forte, o mais esperto, sempre leva vantagem, vai perceber
essas energias como vindo de algo muito forte, poderoso, contra o qual não há
chance, e se sentirá imensamente inferiorizado, esmagado mesmo por essa força
tão sobrenatural – e então, em função de sua imaginação naquele momento, poderá
criar situações realmente aflitivas, de total dependência em relação a uma
força opressora.
Uma pessoa que tenha vivido com medo de tudo e de todos,
nessa hora sentirá um verdadeiro pavor dessa energia, e tentará negá-la de
qualquer forma o que poderá atrasar imensamente seu processo de transição,
podendo fazê-la ficar um tempo mais ou menos prolongado em uma espécie de
“umbral”, em que sofrerá coisas terríveis, em consonância com os fatores que
disparam seus medos.
Já uma pessoa que se considerava a mais poderosa do mundo, e
sempre teve um orgulho excessivo, esta se deparará com uma energia diante da
qual ele não é quase nada (isso é uma típica ilusão de quem tem orgulho
exagerado, ao ver algo muito poderoso à sua frente), e isso provocará uma
tomada de consciência muito dolorosa, uma verdadeira desilusão, que abalará
suas crenças arraigadas, provocando imenso desconforto, sentido de formas
variadas.
Poderíamos dar vários exemplos aqui, mas é importante frisar
que todas essas sensações desagradáveis não são reais em sua essência, sendo,
naquele momento, um fruto de nossa mente, de nossa imaginação, uma consequência
natural de todos os condicionamentos ruins que desenvolvemos ao longo de nossa
vida. Isso reforça a ideia já
apresentada aqui de que precisamos nos preparar adequadamente para a morte,
para evitar essas ilusões tão dolorosas ao fazermos a transição para os planos
mais sutis.
Por outro lado, se o agonizante encarava a vida de forma
harmoniosa e construtiva, tendo consciência do significado e da importância da
morte, e se ele sabia tratar as questões dissonantes de seu coração e sua
mente, de forma a encarar a vida e a morte com a humildade, o respeito e a sabedoria
que elas merecem, seu suspiro final será literalmente um grande momento, em que
ele poderá se aproximar rapidamente de Deus, fazendo sem problemas ou
obstáculos a transição para os planos mais sutis da existência. Será uma harmoniosa iniciação, como várias
outras que ele já teve, mas muito especial.
E como se preparar então para esse momento “grandioso”? Essa pergunta não é fácil de ser respondida,
e na realidade você tem a vida inteira para descobrir – acho uma boa ideia
meditar, sempre que possível sobre esse profundo tema.
Posso dizer que oração e meditação frequentes, exercícios de
harmonização cósmica, visualizações criativas abordando o momento da morte,
tudo isso é bastante útil, e reduz bastante a angústia e o medo que podem
atrapalhar imensamente e esse momento.
Sobre a visualização criativa, esta consiste em fechar os
olhos e se concentrar em uma imagem, como que a projetando em uma “tela mental”,
buscando vivenciar a situação com os cinco sentidos e as emoções, como que “vivendo”
aquele momento, como se ele fosse real.
E estou sugerindo que se faça isso com o momento da morte – visualize-o,
sinta-o, perceba o que ocorrerá, o velório, as pessoas tristes, seu corpo
inanimado. E além disso visualize o que
vem depois, o encontro com essa energia maravilhosa, mais poderosa que tudo o
que você conhece – visualize a “grande iniciação”. Esse é um exercício poderoso, para ser feito
de vez em quando, pode ser de grande ajuda.
Mas, mais importante que qualquer exercício específico, a
melhor preparação possível para uma “boa” morte é uma vida bem vivida,
plenamente, aproveitando tudo o que esse mundo nos oferece, interagindo de
forma harmoniosa com as outras pessoas, com a natureza e com você mesmo. Termino esse texto com um apelo: viva bem, e
terá a morte como grande amiga!
Saudações fraternas.
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